A REVELAÇÃO PROGRESSIVA DE DEUS

02-10-2021 17:16

A REVELAÇÃO PROGRESSIVA DE DEUS

Ademir Ifanger

Introdução

1. O Novo Testamento é o cumprimento do Antigo Testamento

Ao interpretarmos as Escrituras precisamos entender que a revelação do plano de Deus é feita de forma progressiva. O Novo Testamento é o cumprimento do Velho Testamento. Sem este, aquele ficaria confuso, incompleto, pois não teria uma ancoragem histórica anterior. Da mesma forma, sem o N.T., o V.T. não teria uma completude. No V.T. temos promessas, profecias, sinalizações por meio de tipologias etc. que apontam para um cumprimento final em Cristo.

2. Outra diferença entre o Antigo e Novo Testamento

No V.T. a missão de Israel era centrípeta, atrair as pessoas para dentro da nação. Por isso as leis, o templo, as promessas, o sacerdócio, tudo era centralizado neles. No N.T., ao contrário, a missão da Igreja é centrífuga, de dentro para fora. Vemos isso em Mateus 28.18-20 e Atos 1.8, onde o Senhor comissiona sua Igreja a sair e fazer discípulos dentre as nações da Terra.

I - COMO JESUS SE REVELA AOS DISCIPULOS

1. Progressiva, experimental e contextualmente

O processo desta revelação, ou do discipulado, é melhor entendido quando vemos a maneira usada por Jesus para se relacionar com seus discípulos. Em João 15.13-16 esse processo fica muito claro: “Ninguém tem maior amor do que este: de dar alguém a própria vida em favor dos seus amigos. Vós sois meus amigos, se fazeis o que eu vos mando. Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho dado a conhecer. Não fostes vós que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros e vos designei para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome, ele vo-lo conceda.”

  1. a. Processo do discipulado: Servo, amigo e fruto (João 15.13-16) - Primeiro, eles são servos: recebem tarefas, incumbências, orientações. Segundo, eles “vestem a camisa” como costumamos dizer. Terceiro, eles começam a dar frutos e se tornam missionários. Temos, portanto, uma progressão, tanto no âmbito da experiência como do contexto, possibilitando que as palavras de Jesus, por meio deles, encontrem espaço para sua realização.
  2. b. Ancoragem e experiência (João 16.12-13), Jesus fala da necessidade dos discípulos terem uma base mais sólida para conseguirem suportar o que ele ainda tinha para lhes revelar: “Tenho ainda muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora; quando vier, porém, o Espírito da verdade, ele vos guiará a toda a verdade; porque não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido e vos anunciará as coisas que hão de vir.”
  3. c. Reino de Deus e consumação (Atos 1.6) Jesus falara com os discípulos sobre o reino 40 dias após a ressurreição (Atos 1.3). Isso refere-se a Sua segunda vinda (Mateus 24.36).

II – JESUS SE REVELANDO AOS DISCIPULOS

MATEUS 16.13-25

Hoje, no processo da Igreja de fazer discípulos, precisamos levar em conta a condição que as pessoas estão para poderem receber revelações. O capítulo 16 de Mateus nos traz bastante luz acerca dessa revelação progressiva.

1. Que diz o povo ser o Filho do homem?

“Indo Jesus para os lados de Cesareia de Filipe, perguntou a seus discípulos: Quem diz o povo ser o Filho do Homem?” (vs. 13).

Jesus dá uma dica aos seus discípulos, pois a expressão “Filho do Homem” é uma referência à sua identidade messiânica. Os discípulos precisavam saber o que o povo dizia porque eles mesmos seriam as respostas para as perguntas das pessoas. Desta forma, eles deveriam estar antenados com a realidade do mundo à sua volta.

Aprendemos então que precisamos estar antenados com o mundo ao nosso redor, com a realidade social, pois a revelação não vem a nós de forma etérea, mas por situações concretas da vida, onde as experiências e circunstâncias criam espaço para Deus nos falar. É dessa forma que respostas às perguntas da sociedade.

2. A resposta do povo

“E eles responderam: Uns dizem: João Batista; outros: Elias; e outros: Jeremias ou algum dos profetas.” (vs. 14).

Essa resposta é intrigante pois o contexto da época era muito religioso – bem diferente do atual, que se caracteriza pelo relativismo e ausência de verdades absolutas. Aquele povo estava conectado com o V.T. e não tinha ideia de quem era Jesus, aquele que veio justamente para cumprir o V.T. Essa resposta também sugeria que eles criam na reencarnação, pois as pessoas que citam já estavam mortos. Assim, havia uma grande mistura religiosa.

3. A pergunta chave

“Mas vós, continuou ele, quem dizeis que eu sou?” (vs. 15).

Os próprios discípulos ainda não tinham uma plena revelação do Messias, pois ele queria se revelar a eles não por um assentimento intelectual, mas por uma revelação interior contínua e progressiva. Os discípulos precisavam de revelação!

4. A resposta de Pedro

“Respondendo Simão Pedro, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo.” (vs. 16).

Há uma revelação fundamental nessa resposta: Jesus não era somente o Messias, mas também o “Filho do Deus vivo”. Isso não estava na expectativa judaica, pois esperavam o Messias como um rei que os governaria e subjugaria o império romano. Porém, Jesus também era um Rei e veio para cumprir o que Davi havia profetizado no Salmo 110.1-2: “Disse o Senhor ao meu senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés. O Senhor enviará de Sião o cetro do seu poder, dizendo: Domina entre os teus inimigos.”

Essa profecia cumpriu-se plenamente na ascensão de Jesus, quando ele se assentou à direita do Pai. Ele mesmo explicou isso aos fariseus que lhe questionaram: “Reunidos os fariseus, interrogou-os Jesus: Que pensais vós do Cristo? De quem é filho? Responderam-lhe eles: De Davi. Replicou-lhes Jesus: Como, pois, Davi, pelo Espírito, chama-lhe Senhor, dizendo: Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés? Se Davi, pois, lhe chama Senhor, como é ele seu filho? E ninguém lhe podia responder palavra, nem ousou alguém, a partir daquele dia, fazer-lhe perguntas.” (Mt 22.41-46).

Essa verdade foi melhor explicada pelo escritor do livro aos Hebreus: “Ele, que é o resplendor da glória e a expressão exata do seu Ser, sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder, depois de ter feito a purificação dos pecados, assentou-se à direita da Majestade, nas alturas, tendo-se tornado tão superior aos anjos quanto herdou mais excelente nome do que eles. [...] mas acerca do Filho: O teu trono, ó Deus, é para todo o sempre; e: Cetro de equidade é o cetro do seu reino. [...] Ora, a qual dos anjos jamais disse: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos por estrado dos teus pés?” (1.3,4,8,13).

5. A resposta de Jesus a Pedro

Seguindo o diálogo com Pedro, Jesus lhe respondeu: “Então, Jesus lhe afirmou: Bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue que to revelaram, mas meu Pai, que está nos céus. (v. 17)

Essa é a primeira revelação que nós, como servos de Deus, precisamos ter: a revelação de quem é Jesus. Sem isso, nada do que vier em seguida terá sentido. Ele é o centro de toda a revelação e propósito do Pai, a chave hermenêutica para a compreensão das Escrituras. Essa revelação de Jesus como Rei e como Filho de Deus é o fundamento ou a base da nossa fé: “Quem é o que vence o mundo, senão aquele que crê ser Jesus o Filho de Deus?” (1 Jo 5.5). Assim, quem crê no Filho crê na sua missão – e é isso que vence o mundo. Não é uma fé solta, descontextualizada ou desconectada de tudo, mas uma fé que procede de uma revelação divina!

6. Edificação da igreja

“Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.” (v. 18).

A revelação dada a Pedro expressa a missão apostólica, pois naquele momento ele estava representando todos os apóstolos. Paulo diz que nós, a Igreja, estamos “edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, sendo o próprio Cristo Jesus a principal pedra angular desse alicerce.” (Ef 2.20). Ele faz aqui uma conexão entre os profetas (V.T.) e os apóstolos (N.T.), fato igualmente confirmado pelo escritor aos Hebreus: “Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos dias, nos falou pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo.” (Hb 1.1-2).

Os apóstolos eram a fonte da doutrina cristã no N.T., assim como os profetas o eram no V.T., pois suas palavras apontavam para Cristo. Mais tarde, Pedro confirmou isso: “...para que vos recordeis das palavras que, anteriormente, foram ditas pelos santos profetas, bem como do mandamento do Senhor e Salvador, ensinado pelos vossos apóstolos.” (2ª Pedro 3.2). Desta forma, todas as palavras dos profetas estão embutidas nas palavras ou revelação dos apóstolos e vice-versa.

A segunda revelação que devemos ter é que Jesus está edificando a sua Igreja – e isso só é possível sobre o fundamento das palavras proféticas e apostólicas. A Igreja é a completude ou plenitude de Cristo, como disse Paulo: “E pôs todas as coisas debaixo dos pés e, para ser o cabeça sobre todas as coisas, o deu à igreja, a qual é o seu corpo, a plenitude daquele que a tudo enche em todas as coisas.” (Ef 1.22-23).

III – CHAVES DO REINO

Jesus prosseguiu em sua revelação progressiva ao afirmar:

Dar-te-ei as chaves do reino dos céus; o que ligares na terra terá sido ligado nos céus; e o que desligares na terra terá sido desligado nos céus.” (vs. 19).

1. Através do reinar de Deus a igreja é edificada

Essas chaves só funcionam se estiverem sobre o fundamento da revelação de quem é Jesus e das palavras que nos transmitiu.

Jesus é Rei e é Filho! Sem essa revelação não temos absolutamente nada para falar ou fazer. O Reino de Deus por meio de Jesus é o centro de toda doutrina profética e apostólica, da revelação divina na história humana. Podemos falar muitas coisas boas e edificantes às pessoas, mas sem a compreensão exata desta revelação progressiva de Jesus, da Igreja e do Reino nossas palavras serão incompletas, desprovidas de valor e fundamentação.

2. Chave da edificação – discipulado

“Desde esse tempo, começou Jesus Cristo a mostrar a seus discípulos que lhe era necessário seguir para Jerusalém e sofrer muitas coisas dos anciãos, dos principais sacerdotes e dos escribas, ser morto e ressuscitado no terceiro dia.” (vs. 21).

A obra de Deus seria plena e consistente por causa da morte, ressurreição e ascensão de Jesus.

“Então Pedro, chamando-o à parte, começou a repreendê-lo, dizendo: Que Deus não permita, Senhor! Isso de modo nenhum irá lhe acontecer. Mas Jesus, voltando-se, disse a Pedro: Saia da minha frente, Satanás!  Você é para mim uma pedra de tropeço, porque não leva em consideração as coisas de Deus, e sim as dos homens.” (vs. 22,23).

Este é um grave problema que enfrentamos: tomarmos decisões baseados em nossos sentimentos. A natureza humana decaída sempre dá acesso a Satanás e aos incontáveis males e pecados.  Em seguida, Jesus prosseguiu para um nível maior de revelação, que é a base do discipulado:

“Então Jesus disse aos seus discípulos: Se alguém quer vir após mim, negue a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida a perderá; e quem perder a vida por minha causa, esse a achará.” (vs. 24,25).

Sem essa revelação e experiência não seremos discípulos. É fato que nos identificamos com Pedro, nessa sua atitude, em muitos momentos e áreas de nossas vidas. O que ele disse a Jesus foi de certa forma legítimo. Porém, se não atingirmos a condição de negar-nos a nós mesmos e deixarmos que Jesus reine, não seremos discípulos. E mais: precisamos também levar as pessoas aonde nós estamos pois isso é fazer discípulos. A velha natureza deve ir para a cruz, porque já estamos crucificados com Cristo, e a nova natureza deve estar diariamente no altar do sacrifício, como diz Paulo em Romanos 12.1-2. Portanto, negar a nós mesmos é condição essencial para a prática do discipulado. Não é só ensinar as pessoas a serem capazes de fazer alguma coisa, mas, principalmente, de negar a si mesmas.

Conclusão

Deus sempre nos revela Seu plano de forma progressiva. Jesus é Rei e é Filho. Ele revela como a Igreja é edificada através dos ministérios (Ef 4). O Reino é a chave da edificação, e o discipulado é a experiência que temos com a revelação. Todas as palavras e obras de Jesus são ensinos maravilhosos e necessários, mas só conseguiremos captá-los com essa revelação de Jesus em Mateus 16.

Transcrição e Edição: Luiz Roberto Cascaldi

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